Candy Welz
A valiosa edição de 1543 foi encontrada durante a identificação dos livros queimados, uma década depois do acidente que marcou a história da biblioteca Anna Amalia
Dez anos após a tragédia que dizimou 50 mil livros da biblioteca alemã Anna Amalia, na noite de 02 de setembro de 2004, em Weimar, uma obra valiosa foi encontrada durante o processo de identificação dos livros queimados: uma primeira versão impressa de “A Revolução de Esferas Celestes”, o principal trabalho do astrônomo Nicolau Copérnico, publicado em Nürnberg em 1543. O anúncio foi feito durante o balanço dos acontecimentos dos últimos dez anos. A obra deve entrar agora em processo de restauração. Anotações de antigos usuários do século 16 já foram identificadas.
A biblioteca, construída no final do século 17 pela duquesa de Weimar e da Saxônia, Anna Amalia, foi uma das primeiras do principado aberta ao público. Escritores famosos do classicismo alemão como Goethe e Schiller eram frequentadores exímios da casa. Entre as jóias do acervo constam manuscritos da Idade Média, incunábulos — livros impressos nos primórdios da imprensa—, a maior coleção de Fausto do mundo, a principal obra de Johann Wolfgang von Goethe, além de originais do filósofo Nitzsche e partituras do compositor Franz Liszt.
Maik Schuck
Na noite do dia 02 de setembro de 2004, o fogo iniciado no andar superior da biblioteca foi responsável por umas das maiores tragédias de Weimar. Cerca de 900 pessoas em fila conseguiram retirar do edifício 28 mil livros intactos. Os títulos citados acima não foram atingidos pelo fogo. No resgate histórico de obras consta também uma edição de couro dos relatos de viagem de Alexander Von Humboldt, de 1811, além de uma bíblia traduzida para o alemão pelo reformador Lutero, em 1534, e ilustrada pelo pintor renascentista Lucas Cranach. Em 2007, a biblioteca reabriu suas portas. “A reforma estrutural do prédio histórico ocorreu perfeitamente ao longo de três anos”, observa o diretor Michael Knoche. Porém, “a reconstrução da coleção de livros durará muito mais tempo, mas nós estamos satisfeitos com o que foi alcançado até agora”, diz. Por conta do jubileu, a biblioteca inaugurará em 30 de agosto a exposição anual intitulada “Restauração depois do incêndio” (Restaurieren nach dem Brand).
Maik Schuck.
Após uma década, grande parte dos 118 mil livros danificados pelo fogo ou pelas conseqüências do incêndio (água, fumaça, fuligem, gases de combustão) estão novamente à disposição no acervo. Dos 50 mil livros que foram totalmente perdidos, 10 mil foram encontrados em antiquários para completar os buracos na coleção. Além disso, já foram restaurados 36 mil livros dentre os 37 mil danificados pela água ou aquecimento. O restante deve ficar pronto até 2015. O processo envolveu inúmeras instituições e 27 oficinas de restauração espalhadas pela Europa, responsáveis por recuperar capas de tecido, couro e até mesmo pergaminhos. Até o momento, investiu-se 67 milhões de euros na recuperação do prédio e das obras. Porém, a parte mais difícil será a restauração dos chamados “livros das cinzas” (Aschebücher), categoria em que se encontra a obra do astrônomo polonês. Tratam-se de 25 mil títulos drasticamente danificados pelo fogo.
Candy Welz
Segundo Knoche, serão precisos ainda cerca de dois anos para que estes livros terminem de serem identificados. Questionado como uma obra dessa dimensão, considerada desaparecida desde 2004, pode ressurgir assim dez anos depois, o diretor da biblioteca explica os procedimentos tomados à época. Logo depois da catástrofe, os livros foram congelados e colocados em caixas. Todo o prejuízo foi classificado em quatro categorias, de acordo com o nível de deterioração. As obras que demandavam um restauro mais complexo foram deixadas por último. Uma das responsáveis pela identificação e catalogação, Katja Lorenz, conta que oito mil livros já foram registrados desde 2012. “É um processo difícil, já que muitas vezes só há uma ou outra palavra capaz de ser identificada na capa queimada”. O que não é o caso da obra de Copérnico, encontrada durante este processo.
Candy Welz
“Nenhum outro livro modificou tão profundamente o olhar da humanidade em relação ao mundo e a si mesma”, diz o presidente da Instituição Weimar Klassik, Hellmut Seemann. A obra com o título em latim “De Revolutionibus Orbium Coelestium, Libri VI” pôs fim ao geocentrismo ao demonstrar que as observações astronômicas eram melhor compreendidas com o modelo do sistema solar que conhecemos hoje.
Ulrich Schwarz.
A finalização do processo de restauração dos livros das cinzas depende do término do trabalho da análise e identificação de cada obra e dos recursos disponíveis. De acordo com o ministro da cultura do Estado da Turíngia, Christoph Matschie, “a restauração do prédio e de grande parte das obras é um grande desempenho”. Para ele, o que se passou nos último dez anos foi uma “demonstração de coragem e engajamento civil”.
Considerada uma biblioteca de pesquisa, especializada em história da arte e literatura alemã em torno do ano de 1800, o acervo atual dispõe de 1,03 milhões de livros. Todos os anos, 90 mil pessoas visitam o prédio histórico da biblioteca, onde fica o famoso salão em estilo rococó e 50 mil passam para conferir exposições temporárias.
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