Uma viagem
para descobrir os Alpes alemães
(Texto originalmente publicado na revista Viaje Mais! Jan.2012)
Desbrave o gelado
Zugspitze a quase 3 mil metros de altura e relaxe em Garmisch-Partenkirchen, a
estância de inverno mais famosa do país
A Baviera, ao sul da Alemanha, é mais conhecida pela Oktoberfest em Munique, a capital estadual, e pelos passeios entre castelos da Rota Romântica como o icônico Neuschwanstein), que começam ou terminam por lá. Mas a região também abriga os Alpes alemães, incluindo o pico mais alto do pais, conhecido como Zugspitze. A área foi um exótico presente do então imperador da Áustria, Francisco José, para a Baviera logo apos seu casamento com a famosa princesa Sissi. Assim, a terra natal de sua mulher ganharia uma montanha “de verdade”, teria dito o soberano.
Ali, a 2.962 metros acima do nível do mar, visitantes comem suas salsichas brancas e tomam cerveja ao lado da placa que faz questão de lembrar: “Biergarten mais alto da Alemanha”. Mas não é só pela sensação de experimentar uma gelada nas alturas que cerca de 500 mil visitantes sobem a montanha todos os anos. A paisagem belíssima e os Alpes oferecem uma gama de atividades como esqui, alpinismos, trilhas, snowboard, exposições e até mesmo programas gastronômicos. Opções de lazer que o tenente Joseph Naus – a primeira pessoas a alcançar o Zugspitze em 27 de agosto de 1820, com a proposta de realizar estudos de topografia para o rei da Bavária – mal poderia imaginar.
As dificuldades para chegar ao topo de maneira rápida, fácil e segura também foram superadas. Hoje não é mais preciso estar em plena forma para chegar lá me cima. Depois de trinta anos de construção, foi inaugurada em 1930 a ferrovia que leva os visitantes de Garmisch – Partenkirchen (a uma hora e meia de Munique) direto ao local.
Até o topo
A rota é operada por uma empresa privada e os trens saem deatrás da estação principal. Tal percurso demora cera de uma hora e quinze minutos. Nos trechos mais íngremes, a locomotiva sobe por túneis. Mas para aqueles que não têm medo de altura, recomenda-se ir de trem somente até a estação Eibsee e de lá pegar o bondinho (Eibsee-Seilbahn), na ativa desde sua construção, em 1963. O Eibsee é um lago bem no pé da montanha, no vale dos Alpes, que merece uma visita. Para quem tiver com tempo, pode até desfrutar um almoço por lá. Depois da rápida checagem nos arredores do lago, é só se preparar para subir. Mesmo para os mais receosos, vale a pena superar o medo. Os ouvidos sentem rapidamente a diferença de pressão e, quanto mais alto, parece até que irá quase colidir com a montanha.
Apesar da descrição parecer assustadora, trata-se somente da primeira sensação. Não é difícil presenciar moças apertando as mãos de medo e soltando-as logo em seguida para apoiá-las nos vidros da frente, com o olhar estarrecido e deslumbrado, tal o espetáculo da natureza. As crianças que iniciam a subida muitas vezes chorando param quase que imediatamente, conforme o Eibsee vai ficando pequeno e para trás, como se tivessem esquecido o motivo inicial do choramingo.
Na chegada, há uma exposição gratuita com filmes e fotos antigas que contam a história do Zugspitze, da construção das ferrovias e teleféricos e até dos estudos meteorológicos. Cartazes, tíquetes antigos e imagens dos trabalhadores cavando o túnel do trem completam o acervo. Mas o destaque é o terraço que se estende até a porção ocidental do topo, na fronteira com o Tirol, na Áustria. Ao atravessar para o outro lado, as fotos são todas voltadas para os Alpes austríacos. De tempos em tempos, passam aviões de pequeno porte praticamente na mesma altura das cercas de segurança. Do lado alemão, lunetas indicam as direções de atrações da Bavária como o castelo Neuschwanstein, do rei Ludwig II. Deste mesmo terraço, uma estação meteorológica fornece informações climáticas há mais de cem anos. Detalhe que passa despercebido: quem vai reparar nisso, quando a plataforma tem à disposição uma vista panorâmica de 360 graus para 23 montanhas de qautro países diferentes (Alemanha, Áustria, Itália e Suíça)?
Um pouco abaixo do Zugspitze (a descida é feita com outro bondinho, o Gletscherbahn) estão as geleiras. Todos os dias, dependendo das condições climáticas, sai um tour às 11h e outro às 13h30 para explorar a região. O ponto de encontro é em frente ao restaurante SonnAlpin. Não esqueça de maneira alguma os óculos escuros! Segundo o guia local, o brilho do sol no topo é quase 20% mais intenso e a neve ainda reflete mais 10% da claridade. Apesar de ser todo em alemão, é interessante se juntar ao tour gratuito nem que seja somente para caminhar pelos pontos mais distantes, acompanhado por pessoas experientes. Os guias, em geral, sabem qual trilha está mais fácil, qual a situação da neve e o quanto está afundando.
Herança esportiva
A mini“expedição” começa em direção a igreja Maria Heimsuchung, capela inaugurada em 11 de outubro de 1981 e em pleno funcionamento. Ali, visitantes podem assistir à missas bem pertinho do céu. E eles o fazem. Mesmo pessoas idosas sobem até a igrejinha, a passos vagarosos para não se desequilibrar no chão escorregadio.
A caminhada continua em direção à pista de esqui. O primeiro boom da região ocorreu com os Jogos Olímpicos de inverno de 1936 e depois com o Campeonato Mundial de Esqui, em 1978. Em fevereiro de 2010, Garmisch - Partenkirchen ganhou as páginas dos jornais novamente, quando abrigou o Campeonato Mundial de Esqui Alpino, o que rendeu cerca de €27 milhões em melhorias da infraestrutura. Eventos que fizeram muitos ambientalistas torcerem o nariz.
Ser a área mais famosa e conhecida para a prática de esportes de inverno tem lá o seu preço. E o fator ecológico é um ponto a ser levado em consideração. “Daqui uns anos, por conta do aquecimento global, é possível que nós não tenhamos mais neve no verão por aqui”, diz um instrutor. Por esta e outras razões, há desde 12 de maio de 1999 um centro de pesquisa ambiental e observação climática. Trata-se do Schneefernhaus. Na realidade, tal construção funcionou como um hotel de luxo cheio de atrações exóticas por 62 anos. Mas, uma pesada avalanche em 15 de maio de 1965, com um saldo de dez morte e 24 feridos, soterrou a história do hotel, que acabou transformado em um centro de pesquisa.
Para pernoitar ali, bem no topo da Alemanha, uma boa pedida é a Aldeia-Iglu (Iglu-Dorf). De 31 de dezembro até meados de abril, dependendo da temperatura, é possível passar a noite à la esquimó e ver o sol nascer e se pôr nas geleiras. O “hotel” é totalmente construído a cada nova temporada e, apesar das adversas condições climáticas, sempre com estilo. Artistas são chamados todos os anos para decorar a morada de gelo. Os quartos para dois, os chamados Iglus românticos, oferecem até esculturas de neve, além de uma garrafa de prosecco de boas-vindas. Os preços variam de €99 a €369 por pessoas e não inclui o transporte até lá em cima. Um guia do hotel encontra os hóspedes em frente ao restaurante SonnAlpin e os conduz em direção aos quartos.
Independente do clima das geleiras, muita chuva ou tempestade de neve, dentro dos iglus vocês fica protegido sempre a uma temperatura entre 0 e -5 graus Celsius. A casa oferece sacos de dormir térmicos e especiais para a ocasião. Para espantar o frio, nada como um fondue de queijo na hora do jantar, iguaria também inclusa na diária. Outras opções gastronômicas são gulasch (sopa húngara) ou o chili com carne. Água e chá estão sempre à disposição. Outros tipos de bebida são pagas pelos hóspedes à parte e em dinheiro! Na escuridão, os mais aventureiros podem se juntar à expedição noturna, uma caminhada de 40 minutos pelas geleiras. Outra boa pedida é aproveitar também a estrutura de sauna e piscina com água quente (sempre entre 38 e 40 graus Celsius) na área comum do complexo. É desnecessário lembrar que calças térmicas, sapatos confortáveis, gorros e luvas são imprescindíveis. Vale a dica que não há duchas e os banheiros são químicos, individuais ou coletivos. Pode ocorrer, por razões de segurança, pelo menos duas ou três noites por temporada, que os hóspedes tenham de deixar seus iglus e se dirigirem ao restaurante SonnAlpin. Embora a aldeia gelada não se encontre em áreas ameaçadas por avalanches, a qualquer sinal de perigo são tomadas as precauções necessárias.
No terraço onde está o SonnAlpin dezenas de visitantes deitam em espreguiçadeiras para aproveitar o sol do inverno, enquanto apreciam as delícias gastronômicas bávaras. Ali bem ao lado, o café Gletschergarten é uma boa dica para quem não quer almoçar, mas só saborear diversos tipos de bolos e tortas, regados a chás, cafés e até mesmo uma taça de vinho – tome cuidado, pois o efeito do álcool a quase 3 mil metros do solo é um pouco mais intenso. Inaugurado no verão de 2007, o café é todo envidraçado, o que não priva os turistas da bela paisagem.
Minitrenós à disposição
Durante a temporada, é possível alugar esquis e outros equipamentos. Porém, enquanto o inverno não aparece, dezenas de minitrenós ficam espalhados pelo terraço para que os visitantes arrisquem uma descida pelas montanhas de neve. E não somente as crianças que se deixam levar pela brincadeira. Adultos ficam e prontidão esperando por um trenozinho livre. No final do dia, a disputa diminui. Ainda assim, é de bom tom trazer o equipamento de volta após descer ladeira abaixo, mesmo que você esteja atrasado para pegar o último trem que desce para o vale às 16h30. Pouquíssimas vezes no ano, geralmente no verão, é possível vivenciar lá em cima a “Noite da Bavariera”. Depois que todos os turistas deixam o Zugspitze, sobe uma secreta locomotiva às 17h15. Quando o sol se põe e a montanha se encontra na mais completa escuridão, os felizardos são acomodados no restaurante SonnAlpinn para um jantar buffet com iguarias e musicas típicas da Bavária. Há também a versão do jantar de gala durante a lua cheia, com datas também muito restritas. A recepção ocorre no terraço com champanhe e o jantar no restaurante Panorama Lounge.
Trilhas e bondinhos