Um camburão azul e branco chega em
velocidade um pouco acima da média, vira bruscamente a esquerda, sobe na guia
da calçada e breca abruptamente. A porta se abre, dois policiais pulam do
veículo e começam a correr. A cena se passa na minha frente, parada em frente à
faixa de pedestre. Em alguns segundos, imaginei a catástrofe. Meu passaporte
estava em casa. Olhei ao meu redor, faz tempo
que não ouço mais falar em seqüestro relâmpago, assalto à banco ou arrastão. Esfreguei
os olhos com as duas mãos. Abri-os novamente para ter certeza que aquilo não
era uma alucinação. Calma! Não presenciei mais nenhuma tragédia ou aviões
explodindo no céu. Só para relembrar a mazela.
Os dois policiais alemães correm
atrás de um labrador sem coleira e solto na rua. Coisa rara aqui por essas
bandas como já contei em um post anterior. O cão vem em direção aos dois, balançando o rabo com tanta emoção que o
traseiro parecia até mesmo ser embalado por um samba canino. O mantedor da
ordem alemã coloca o braço bem em frente ao focinho do animal, deixa-o cheirar
para estabelecer a boa vizinhança e, ao tenta pegá-lo, é arrebatado por um
pulo do bicho que tenta lamber sua cara! Não vi o desfecho da história, se o
coitado do labrador virou sabão inocentemente ou foi encaminhado para o abrigo
de cães sem teto até localizarem seus donos. Caminhei para casa pensando o
quanto a polícia em Weimar não tem o que fazer.
Lembrei da minha única experiência
(bem sucedida) com a polícia alemã! Não, nunca fui parada para mostrar
documentos. Copa do mundo 2010. Estávamos animadíssimos antes de ver o Brasil
perder para a Holanda. Marcamos todos num biergarten ( péssima tradução para
jardim da cerveja) em frente à embaixada da Espanha em Berlim. Chegamos
esbaforidos, pedalando rápido para garantir o melhor banco de madeira perto do
telão e, se possível, ainda debaixo duma árvore. Largamos as magrelas amarradas
num poste baixinho em frente ao consulado. Depois da decepção da seleção, pizzas
e cerveja de montão, resolvemos voltar pra casa. Mas eis que onde foram parar
nossas bicicletas? Lá vem o guarda com a bandeira da Espanha costurada no uniforme e aquela cara sádica, portadora de um sorrisinho no canto esquerdo da boca. “Ta vendo esta placa ali?”, perguntou. “Aqui
é proibido parar e a polícia acabou de passar”.
Pronto, estava indo embora a pé
mesmo, afinal, pagar a conta para retirar a magrela do pátio sairia mais caro
que comprar uma nova no mercado de pulgas. O problema era mais sentimental com
a lata velha que já tinha nos acompanhado em diversos momentos e travessias. Perguntamos então para a garçonete do Biergarten se ela realmente tinha visto a polícia. Meio sem
paciência, ela mandou a gente ligar no 112! Sim na própria instituição! Olhei
para o celular e para os brasileiros e mexicanos que estavam comigo. “Eu não
vou ligar para o serviço policial e perguntar se eles viram minha bicicleta, às
23h”. O guardinha da embaixada que
entendeu o comentário reforçou o lunático conselho. “Anda, liga”!.
-
Polícia
de Berlim.
-
Alô,
olha, nos estamos em frente a embaixada e nossas bicicletas desapareceram, mas
elas estavam em local proibido. Foi nossa culpa, não vimos a placa (observação: é sempre
bom assumir a culpa para um alemão!)
-
Ah,
vou transferir para o departamento de bicicletas. (surpresa: ah??? Como assim um departamento só disso?)
-
Repetição
da mesma ladainha.
-
Que
cor são as duas bicicletas? Pergunta a chefe do outro lado da linha.
-
Vermelha
e Cinza.
-
Então,
atravessa a rua. Pronto? Anda uns 200 metros a sua esquerda. Procura uma árvore.
Achou?
Elas estavam lá. Realocadas no local
permitido! A policial riu da algazarra e de tanto que agradeci. Eles não só estacionaram
as bicicletas novamente como nem pensaram em levá-las consigo para ganhar um
troco na liberação! E elas provavelmente foram carregadas porque estavam com a corrente de segurança na roda. Pior, o policial que fez a generosa ação, avisou a central
de bicicletas que já sabia do ocorrido, quando liguei para dar queixa! Bom, a noite terminou por aí. Não encontrei
mais nenhum representante da lei no caminho, o que seria perigoso, já que por
aqui é proibido pedalar após beber! Dá bafômetro e tudo! E quando eu conto, as
pessoas me olham desconfiadas, achando que se trata de "causos"....
Obs.: só pra não dizer que a polícia aqui é um
docinho, já tive de desembolsar 10 euros só porque deixamos o carro em frente
ao banco (com motorista na direção) e ligamos o pisca! “Esse pisca agora dá o
direito de parar onde vocês querem? Na ja... como dizem os bons alemães...
Obs.1. Aquele barulho por causa do labrador..... Agora reparem na
quantidade de viaturas só para uma passeata com mulheres e crianças no bairro
turco de Kreuzberg!
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