segunda-feira, 23 de março de 2015

Banhos marroquinos: Hammams

Imagem do site Hammam Ziani
               
             Escrevi no post anterior sobre o possível choque para aqueles que entram desavisados em uma sauna alemã. E na levada dessa temática de banhos e saunas pelo mundo, aproveito aqui o embalo para contar dos Hammam marroquinos. Em árabe o termo significa banho ou ducha e é algo pensado para o coletivo. A primeira vez que fui ao Marrocos, passei longe dessa experiência. Até esticava o pescoço para bisbilhotar, mas saía de fininho quando alguma funcionária puxava meu braço balbuciando coisas em árabe e tentava me jogar para dentro do balneário. Foi só quando comecei a me preparar para minha segunda visita ao país — rumo a Fez e Casablanca — que resolvi incluir a experiência no roteiro.
Lia a narrativa de Fátima Mernissi, em Harem, uma socióloga e feminista de Fez, e ela contava de suas visitas às casas de banho para relaxar depois do trabalho. E fez um adentro — aquele ambiente não tinha nada a ver com a limpeza hospitalar das saunas alemãs e escandinavas. 
E não tem muito mesmo. Fomos ao Hammam Ziani, em Casablanca, e a diferença já começava logo na entrada: homens para um lado, mulheres para outro. Fechei um pacote com o tal do banho-esfregação, hidratação e massagem, que me dava direito ao Kit com apetrechos, buchas e sabão. Tranquei as coisas no armário, vi várias mulheres tiraram seus véus, se trocarem, guardarem tudo e desaparecerem no vapor dos banhos, enquanto eu olhava sem saber para onde ir. Uma funcionária apontava os dedos na direção onde o ritual começaria. 
Cheguei a um ambiente úmido. À direita tinha uma sauna e do lado de fora diversas mesas de azulejo branco. Ali as mulheres eram literalmente esfregadas pelas funcionárias da casa. Algumas até tinham  que se segurar na barra de ferro para não escorregar com a força da limpeza. Mandaram-me para dentro da sauna úmida. Fiquei por lá, copiei as mulheres que passavam a pasta do Hammam no corpo e se davam banhos com água da canequinha de uma fonte. Saí e fiquei esperando a hora da esfolação, ops esfoliação. Uma garota mais nova, muito bonita e que já entrara sem lenço, percebeu minha cara de “não estou entendendo nada” e perguntou, em inglês, qual era o problema. Expliquei o pacote que tinha fechado, disse que ainda não tinha recebido meu kit limpeza. E aí começou um furdúncio. Ela explicava para as atendentes que falavam, falavam em árabe e a moça rebatia. E eu só olhava! A mocinha apontava o dedinho indicador e fazia cara de indignação. Apareceram com meu kit. Agradeci com o olhar. Ela sorriu.
Hammam da mesquista Hassan II em Casablanca

Sentaram-me na mesa e a funcionária nem quis saber de abrir meu instrumentos novinhos de banho. Pegou mesmo a bucha em forma de luva que estava usando na mulherada e começou a esfregar partes do corpo que nem eu lembrava que tinha! E eu fui ficando vermelha. Limpinha, mas vermelha. As pelas mortas foram indo para as cucuias. Então me arrancaram de lá e conduziram-me até uma outra sala. Lá, uma atendente falou com a outra. Fiquei sentada em um banquinho — à época com cabelos curtos,  só com a parte de baixo do biquíni e com o bronzeado há muito desbotado— observando. Isso sim foi esquisito. Semi nua, sem entender uma palavra de árabe e contando com a simpatia alheia de alguém me mostrar para onde ir.
Era um zunzunzum de mulheres, todas voluptuosas, de cabelos longuíssimos, cuidando da pele, algumas se depilavam sobre pias (achei isso bem esquisito), mães penteavam as compridas madeixas das filhas. Algumas ficavam mais quietas aproveitando os rituais de beleza, outras saçaricavam e conversavam em um clima de salão de beleza de bairro. Confesso que até me causou estranhamento vê-las sem véu, tão à vontade em um ambiente que lhes parecia bastante familiar. Uma das mães mandou a filha me perguntar se eu era alemã! Disse que não, enquanto me deitavam para sei lá qual tratamento de hidratação que eu tinha acertado na entrada. Fizeram-me uma massagem, enquanto isso a matriarca, a filha e a massagista falavam e riam. De tempos em tempo, a garota balbuciava uma ou outra pergunta em inglês (meu francês e árabe são nulos). Depois me enrolaram em um plástico branco, feito um temaki albino, e foram embora. Fiquei lá, tipo uns 40 minutos, com os braços dentro da engenhoca, olhando aquele vai e vem de moças. Até que alguém lembrou de me tirar de lá e me mandar para o chuveiro. Sai com a sensação de não precisar tomar banho pelos próximos quinze dias! E certa que todo estranhamento só vem do que nos é desconhecido. Super recomendo! Mais umas três visitas a Hammams diferentes e já poderei escrever um post com dicas de como não parecer uma estrangeira esquisita. 

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