sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Barbaridades Germânicas


Não conheço nenhum cidadão que já tenha declarado não gostar de viajar. Pois é, há um ano deixamos o Brasil animadíssimos, afinal de contas tem coisa melhor do que conhecer novas pessoas, lugares, comidas e aprender uma nova língua? Passados tantos meses e superadas todos as dificuldades iniciais já conseguimos rir das peculiaridades que enfrentamos ao chegar. Temos que admitir que iniciar uma vida, regularizar toda a documentação em um país ultra organizado, de temperaturas geladas e de palavras gigantes é bastante complexo. Primeiro de dezembro, -10 graus (ainda ia piorar) e nosso despertador tocou às 6h da manhã. Às vezes eu acho que só poderia mesmo estar maluca, cair da cama nesse frio a essa hora para começar meus primeiros passos na língua de Brecht. Morávamos no sinistro prédio na Eisenbahnstrasse (a rua dos trilhos do trem), uma caminhada de 40 minutos até o Instituto de Línguas na Universidade de Leipzig (famoso InterDaf). 

Primeiros Passos


O que deveria ficar registrado em um post de inauguração, se é que ele se faz necessário? Já que não se trata de trabalho, não preciso de linha editorial, certo? Então já risquei um motivo da minha lista. Pois bem, acho que mudarei de foco com a mesma freqüência que mudo de roupa, mas por que não? Minha estadia na Alemanha já começou há 427 dias e só agora decidi registrar por escrito experiências, viagens e observações. Mas se eu atrelasse o blog à viagem, por que continuaria a escrever quando ela terminasse? Por isso, acho que falarei de “Pekuliaridades” alemãs, brasileiras, familiares, pessoais, jornalísticas, femininas, acadêmicas , lingüísticas e por aí vai. Um exercício diário de relatos? Hum, também não vou definir periodicidade (odeio definições em geral), mas prometo levar o projeto à sério, já que toda pessoa “antenada” hoje em dia tem um blog, segundo especialistas de plantão. Pelo menos com esse diário dos tempos modernos (apesar de não ser da época do cromo, sou um pouco relutante com algumas invenções técnicas e formas de exposição) não correrei o risco de esquecer detalhes do cotidiano, livros e filmes que me impressionaram, notícias que me intrigaram, amigos que fizeram a diferença e as cores de tantas novidades que com o passar do tempo, com o peso da rotina ficam embaçadas e pouco nítidas. Desinteressante? Sei lá. A autora vienense Maxie Wander (1933-1977) entrevistou 19 mulheres absolutamente comuns que viviam na antiga DDR (ex-Alemanha Oriental). O resultado foi um livro, lançado em 1977 pouco antes de sua morte, com o titulo “Guten Morgen, Du Schöne”. Certa vez disse a escritora sobre sua coleção de relatos: “toda vida é bastante interessante para ser compartilhada com outras pessoas. Decisivo para mim foi se uma mulher tinha a vontade ou a coragem para contar sobre si mesma” (Ich halte jedes Leben für hinreichend interessant, um anderen mitgeteilt zu werden... Entscheindend war für mich, ob eine Frau die Lust oder den Mut hatte, über sich zu erzählen). Então, aí está. Agora estou com vontade e coragem para começar a contar.